Colunista Luciano Medina Martins: Deus é brasileiro

COLUNISTAS Luciano Medina Martins
Foto: Tânia Meinerz
Foto: Tânia Meinerz

Este mês se comemora o primeiro vôo do 14 Bis em Paris 110 anos atrás. O que vemos em Porto Alegre, no RS e no mundo confirma justamente o impacto dessa realização na vida da cidade.  A Festa Nacional da Música, trouxe dezenas de artistas de vários pontos do Brasil a capital e gerou nela um cenário de atividades ligadas à música que a coloca no centro das atenções nacionais e internacionais.

Dia 28 de outubro, um contexto de internacionalidade começa a acontecer na Feira do Livro, com a convergência de autores de vários estados e países transformando Porto Alegre no cenário de debates literários visíveis no mundo todo. O avião possibilita que este contexto exista. Por trás disso temos a produção que realiza estes acontecimentos. As comunicações por internet também contribuem para que estes arranjos aconteçam. 

A consequência desta maior facilidade nas relações internacionais é a necessidade de profissionais que entendam do que se chama em inglês de “cross-culturality” ou “multi-culturality”, gerir estes novos fenômenos exige que os executivos além de falarem uma língua estrangeira compreendam a cultura de origem, de destino das pessoas. Além de palavras, gestos, expectativas e maneiras de perceber o que acontece, importam o comparar de valores, de atitudes, de crenças e de percepções que podem enriquecer a experiência garantida que não aconteça a falta de comunicação, a falta de compreensão, chamada de “communication breakdown”.

O Brasil recebeu uma Copa do Mundo e uma Olimpíada. O que vimos foi a cultura brasileira da hospitalidade, da paz e da confraternização se tornar uma referência. O quanto fomos percebidos como festivos e espontâneos ou ingênuos e desorganizados? Como pacíficos e acolhedores ou descontextualizados e carentes? Talentosos e musicais ou sem tecnologia e sem sofisticação? Medimos estas percepções? Deslocamos nossa pesquisa e inteligência acadêmica para avaliar a impressão sendo levada daqui e o quanto ela pode atrair mais recursos ou mais rejeição? O  Brasil conseguiu documentar e organizar registros sobre o que estes estrangeiros experimentaram aqui, ou deixamos a “vida nos levar” seguros de nossa sensibilidade e sorte de Deus ser brasileiro?

Avaliar e estudar mais sobre o que os estrangeiros pensam e levam como experiência da vinda ao Brasil nos prepararia para o maior desafio de nossa era de idas e vindas a bordo de uma máquina inventada por um brasileiro, que concebeu esta maravilhosa invenção fora do Brasil. 

Esta metáfora, 110 anos depois, leva a várias reflexões, entre elas de que a nação brasileira ainda precisa dar asas a sua enorme potencialidade de ser o local onde se estabelecem novos paradigmas para um mundo mais espontâneo, criativo e tolerante. O que, claro, se constitui em uma visão romântica e otimista, como a de muitos dos brasileiros que buscam uma vida mais digna e produtiva. Como a Serra Gaúcha e outras regiões do Rio Grande do Sul tem se beneficiado desta convergência internacional promovida na capital gaúcha que é o terceiro mais procurado destino no Brasil para convenções e seminários. Perguntas que profissionais e pesquisadores de cross-cultural communications já tardam em responder. Só para lembrar, os irmãos Villas-Boas e seu rico trabalho etnográfico consagrou-se como referência mundial na antropologia, que demos então continuidade a esta tradição.  O mais alarmante é constatar que YouTubers sensacionalistas falando em inglês sobre os perigos de vir ao Brasil serem os conteúdos mais visualizados sobre o Brasil fora dele. Ainda bem que Deus é Brasileiro.

*Luciano Medina Martins – Jornalista

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